Bob Fernandes

POR CLAUDIO LEAL, DIRETO DO RIO DE JANEIRO
Naquela charla de político salivando para repercutir o último lance da pátria, na porta do teatro Oi Casagrande, Chico, o Alencar, arrisca-se a cantarolar "Luz do Soooool", leve pausa, e "gosto muito de te ver, leãozinho/ caminhando sob o sooool". Ênfase no astro-rei. O show "Primavera Carioca", no palpite feliz do deputado federal do PSOL, poderia ter favorecido mensagens subterrâneas, olha lá, se censura houvesse. "É um manifesto contra o abuso do poder econômico nas eleições… Caetano falou do Sol porque o Sol é para todos", sugere Alencar, martelando o símbolo do partido do candidato socialista à prefeitura do Rio, Marcelo Freixo.
Mas a essa altura o show havia terminado. Duas horas antes, sem os garrotes da censura prévia, mas com o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) atento a qualquer freixada, o compositor Caetano Veloso iniciara um folhetim musical e afetivo do Rio de Janeiro. "Muitíssimo obrigado a vocês por terem vindo celebrar a chegada da primavera carioca", jogou o artista. E, sim, você sabe o que ele quis dizer.
Produzido para arrecadar fundos (R$100 mil) para a campanha de Freixo, o show de terça-feira (11) não poderia fazer a defesa aberta do candidato. Nem seria preciso, pois o Rio dos bossanovistas Tom Jobim e Vinicius de Moraes, do sambista Noel Rosa e da vedete Zaquia Jorge, cuja morte inspirou o samba "Madureira chorou", vincula-se ao ideário de resgate evocado pelos discursos de Freixo – o qual, apesar das companhias estelares, segue bem abaixo de Eduardo Paes (PMDB) nas pesquisas de intenção de voto.
Numa pescada subliminar, a música "O X do problema", de Noel, não deixa de ser uma escolha sofisticada para o evento de apoio financeiro ao xis de Freixo, com cerca de mil pagantes. Independente da política, mas imerso nela, Caetano liderou um show que lhe permitiu recriar clássicos brasileiros; standards dele próprio, como "Menino do Rio", ou de outros compositores: "Copacabana", de Braguinha e Alberto Ribeiro, e "Madureira chorou", de Carvalhinho e Julio Monteiro. Que haja um bom registro audiovisual para guardar o precioso canto de "Copacabana", pois nele tanto houve os vestígios de um discípulo de João Gilberto quanto as nuances desfolhadas do intérprete Caetano. As palavras ganharam outra cadência, algo próxima ao canto falado e afinada ao tempo mais escandido do fim de tarde na praia carioca.
"Madureira chorou" é outra história. Não satisfeito com sua interpretação, Caetano voltou a entoá-la, rememorando a permanência de um ano no Rio de Janeiro, em 1956, quando foi introduzido à cidade por uma prima ("Minha Inha"). Com os olhos da Zona Norte, o garoto de Santo Amaro da Purificação viu pela primeira vez o nome da vedete Zaquia Jorge pregado no Teatro de Madureira. Um ano depois, ela morreria afogada na Barra da Tijuca – e a tragédia, que mal há?, oxigenou uma canção. "É uma das músicas brasileiras mais conhecidas no exterior", informou Caetano. Embatucou-se nos primeiros versos. "Eu fico com vontade de chorar…".
Acompanhado do Trio Preto + 1, ele acelerou em alguma medida o ritmo, logo vertido para a velocidade e a urgência do samba-enredo "É hoje" – ao qual um gaiato sobrepôs, da plateia, um improvisado refrão: "Essa é a hora de Freixo chegar!".
"Agora vou chamar o meu colega, o meu querido amigo, o meu amado Chico Buarque", anunciou Caetano. Hora daquela nota dos cronistas de antanho: delírio na plateia. Quase sem firulas, os dois iniciaram um dueto de "Medo de amar", a bela canção de Vinicius – "que é só de Vinicius", como enfatizou o baiano. Nada de extraordinário e tudo de extraordinário: há duas décadas separados em suas opções políticas, Chico & Caetano coincidem, em 2012, na militância e no canto amadurecido, outonal, e até viril. Sozinho, Chico interpretaria ainda "Futuros amantes", do álbum "Paratodos" (1993), enquanto Caetano se sentava no chão, para ouvi-lo tal como um doce bárbaro dos anos 70. Outra vez juntos, repetiram "O X do problema". Isso mesmo, o xis. No desfecho, com a pegada do Trio Preto + 1, partiram para "A voz do morro", sem recorrer a qualquer auxílio solar na letra do samba.
Caetano e Chico cantam juntos no Rio (Foto: Claudio Leal)
POR CLAUDIO LEAL, DIRETO DO RIO DE JANEIRO
Naquela charla de político salivando para repercutir o último lance da pátria, na porta do teatro Oi Casagrande, Chico, o Alencar, arrisca-se a cantarolar "Luz do Soooool", leve pausa, e "gosto muito de te ver, leãozinho/ caminhando sob o sooool". Ênfase no astro-rei. O show "Primavera Carioca", no palpite feliz do deputado federal do PSOL, poderia ter favorecido mensagens subterrâneas, olha lá, se censura houvesse. "É um manifesto contra o abuso do poder econômico nas eleições… Caetano falou do Sol porque o Sol é para todos", sugere Alencar, martelando o símbolo do partido do candidato socialista à prefeitura do Rio, Marcelo Freixo.
Mas a essa altura o show havia terminado. Duas horas antes, sem os garrotes da censura prévia, mas com o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) atento a qualquer freixada, o compositor Caetano Veloso iniciara um folhetim musical e afetivo do Rio de Janeiro. "Muitíssimo obrigado a vocês por terem vindo celebrar a chegada da primavera carioca", jogou o artista. E, sim, você sabe o que ele quis dizer.
Produzido para arrecadar fundos (R$100 mil) para a campanha de Freixo, o show de terça-feira (11) não poderia fazer a defesa aberta do candidato. Nem seria preciso, pois o Rio dos bossanovistas Tom Jobim e Vinicius de Moraes, do sambista Noel Rosa e da vedete Zaquia Jorge, cuja morte inspirou o samba "Madureira chorou", vincula-se ao ideário de resgate evocado pelos discursos de Freixo – o qual, apesar das companhias estelares, segue bem abaixo de Eduardo Paes (PMDB) nas pesquisas de intenção de voto.
Numa pescada subliminar, a música "O X do problema", de Noel, não deixa de ser uma escolha sofisticada para o evento de apoio financeiro ao xis de Freixo, com cerca de mil pagantes. Independente da política, mas imerso nela, Caetano liderou um show que lhe permitiu recriar clássicos brasileiros; standards dele próprio, como "Menino do Rio", ou de outros compositores: "Copacabana", de Braguinha e Alberto Ribeiro, e "Madureira chorou", de Carvalhinho e Julio Monteiro. Que haja um bom registro audiovisual para guardar o precioso canto de "Copacabana", pois nele tanto houve os vestígios de um discípulo de João Gilberto quanto as nuances desfolhadas do intérprete Caetano. As palavras ganharam outra cadência, algo próxima ao canto falado e afinada ao tempo mais escandido do fim de tarde na praia carioca.
"Madureira chorou" é outra história. Não satisfeito com sua interpretação, Caetano voltou a entoá-la, rememorando a permanência de um ano no Rio de Janeiro, em 1956, quando foi introduzido à cidade por uma prima ("Minha Inha"). Com os olhos da Zona Norte, o garoto de Santo Amaro da Purificação viu pela primeira vez o nome da vedete Zaquia Jorge pregado no Teatro de Madureira. Um ano depois, ela morreria afogada na Barra da Tijuca – e a tragédia, que mal há?, oxigenou uma canção. "É uma das músicas brasileiras mais conhecidas no exterior", informou Caetano. Embatucou-se nos primeiros versos. "Eu fico com vontade de chorar…".
Acompanhado do Trio Preto + 1, ele acelerou em alguma medida o ritmo, logo vertido para a velocidade e a urgência do samba-enredo "É hoje" – ao qual um gaiato sobrepôs, da plateia, um improvisado refrão: "Essa é a hora de Freixo chegar!".
"Agora vou chamar o meu colega, o meu querido amigo, o meu amado Chico Buarque", anunciou Caetano. Hora daquela nota dos cronistas de antanho: delírio na plateia. Quase sem firulas, os dois iniciaram um dueto de "Medo de amar", a bela canção de Vinicius – "que é só de Vinicius", como enfatizou o baiano. Nada de extraordinário e tudo de extraordinário: há duas décadas separados em suas opções políticas, Chico & Caetano coincidem, em 2012, na militância e no canto amadurecido, outonal, e até viril. Sozinho, Chico interpretaria ainda "Futuros amantes", do álbum "Paratodos" (1993), enquanto Caetano se sentava no chão, para ouvi-lo tal como um doce bárbaro dos anos 70. Outra vez juntos, repetiram "O X do problema". Isso mesmo, o xis. No desfecho, com a pegada do Trio Preto + 1, partiram para "A voz do morro", sem recorrer a qualquer auxílio solar na letra do samba.
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