De Mohamad Ali HARISSI (AFP)

BAGDÁ — A rua Mutanabi em Bagdá, com seus cafés e um mercado de livros, um dos mais famosos do mundo árabe, é considerada um refúgio para os amantes da literatura, que encontram lá um alívio para seus sofrimentos, como os atentados e as preocupações do dia a dia.

Às sextas-feiras, esta pequena rua de pedestres da velha Bagdá cria alma nova, quando os donos de sebos organizam seus últimos achados nos balcões. Tentam atrair a atenção dos passantes declamando versos de Al-Mutanabi, um conhecido poeta árabe do século X, que parece zelar pelos presentes do alto de sua estátua.

Outros frequentadores - exclusivamente homens - saboreiam tranquilamente chá com limão ou fumam voluptuosamente o narguilé, no café Shabandar, um dos mais renomados da cidade.

Esta rua de Bagdá não foi poupada dos atentados, e dezenas de pessoas perderam a vida aí. Mas os visitantes estão decididos a não se deixar impressionar.

"Faz 30 anos que venho aqui", conta Kamil Abdulrahim al-Saadawi, um negociante de 59 anos. "Acordo às sextas-feiras dizendo que não vou voltar. Mas a rua Mutanabi é como a mulher amada, nos seduz".

A rua Mutanabi foi inaugurada em 1932 pelo rei Fayçal I, em homenagem ao célebre poeta Aboul Taïeb al-Mutanabi (915-965), nascido no que é hoje o Iraque.

Com menos de um quilômetro, a rua está situada entre o rio Tigre, sobre o qual está o monumento em homenagem ao poeta, e uma estrutura em forma de arco, decorada com uma de suas citações.

"A rua Mutanabi nada tem a ver com a realidade do Iraque; é uma ilha à parte", destaca al-Saadawi.

"Enquanto do lado de fora somos confrontados com a violência e a imbecilidade dos políticos - a nossa realidade -, aqui encontramos o Iraque de nossos sonhos", acrescenta.


- Um Iraque de sonhos -


Este Iraque sonhado não pôde fugir da trágica realidade, como no dia 5 de março de 2007, quando um terrorista suicida explodiu um caminhão na rua, matando 30 pessoas e ferindo 60.

A potência da detonação também destruiu as lojas históricas do local, entre elas o café Shabandar. Os cinco filhos do proprietário foram mortos no atentado. Sua mãe, que ficou cega, por causa do choque, morreu meses mais tarde.

"A explosão é a lembrança mais dolorosa que temos desta rua", suspira Abu Rabea, proprietário de uma livraria há quase 40 anos.

"Viajei a Najaf (centro do Iraque) e quando cheguei, as pessoas me relataram a enorme deflagração", conta. "Meus amigos partiram, perdi muito, a vida não é mais a mesma", acrescenta, com a mão na fronte, os olhos úmidos.

Uma homenagem aos mortos na tragédia foi realizada na rua, para marcar os cinco anos do episódio, com as fotos das vítimas.

A rua Mutanabi só foi reencontrar um ar de normalidade em 2008, mas o café, fundado em 1917 como editora, só foi reabrir em fevereiro de 2009.

Às sextas-feiras, no entanto, inúmeras pessoas parecem ter um encontro marcado. "O que nos faz feliz aqui é a ausência da intolerância e do ódio", define Jamal Saya, que administra, há 25 anos, uma livraria especializada em obras jurídicas. "Mutanabi é o que há de melhor na cultura deste país", segundo ele.

Os frequentadores observam, no entanto, que os anos movimentados pelos quais passou o Iraque influenciaram, grandemente, a oferta de livros disponíveis. Antes da invasão americana de 2003, a maioria dos textos era em árabe, com um grande número deles dedicados à glória do ditador deposto Saddam Hussein.

Hoje, a escolha é mais abundante, com livros em línguas estrangeiras e outros objetos como os de papelaria, além dos CDs e os mapas geográficos.

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