Blog das Frases

Em entrevista ao Le Monde esta semana, Daniel Cohn Bendit, o líder rebelado de 1968, hoje um manso deputado verde do parlamento europeu, criticou duramente o programa da Frente de Esquerda na França.

O programa e o candidato tornaram-se a grande novidade da disputa pela sucessão de Sarkozy, que acontece no próximo dia 22. Jean-Luc Mélenchon detém 15% das intenções de voto com um discurso em que tenta erguer pontes entre agendas até aqui solteiras: a radicalização da democracia; o controle público de setores estratégicos, como as finanças e a energia, e, finalmente, a planificação ambiental.

A Frente de Esquerda não surpreende apenas pela ousadia do projeto. Deixou de ser apenas uma referência exclamativa ao lograr a façanha de unir socialistas descontentes com a domesticação da social-democracia pelos mercados , mas também os comunistas do PCF que viviam à deriva desde o desmanche da União Soviética, ao lado de radicais e progressistas de diferentes gêneros e matizes, inclusive os adeptos do ambientalismo político. Uma convergência de envergadura tal que não se viu nem em Maio de 1968.

Em meio ao funeral do Estado do Bem-Estar social europeu, que cede lugar a uma darwiniana luta pela sobrevivência, a ponto de tornar o suicídio uma opção de incidência assustadora em alguns países do euro, o programa da Frente de Esquerda, na França, tem o mérito de devolver à política um sentido de esperança revogado pelo absolutismo dos mercados.

Os comícios de Mélenchon tem sido os maiores e mais vibrantes da campanha francesa.O debate provocado pela sua ascensão extrapola os limites do pleito local para falar à esquerda em geral, inclusive à brasileira e a seu braço hegemônico, o PT.

Cohn Bendit fuzila a intenção de dar organicidade política e coerência macroeconômica a bandeiras que tem evoluído de forma paralela, quando não antagônica, na busca de alternativas às diferentes dimensões da crise mundial, a saber: a desordem dos mercados desregulados; a saturação ambiental das formas de viver e de produzir sob corolário do consumismo predatório e a impotência da democracia representativa para defender a sociedade dos impulsos descontrolados da finança global.

O deputado verde desautoriza a incorporação da agenda ambiental pela Frente de Esquerda. Cohn Bendit acusa Mélenchon de render tributo ao autoritarismo de Chávez , de Castro e dos chineses, ademais de adotar o que trata ironicamente como um discurso requentado da guerra-fria contra "o imperialismo americano". Para o líder das gigantescas manifestações de Maio de 68 que todavia não impediram a retomada do poder por De Gaulle, a Frente de Esquerda pertence à mesma cepa jacobina e estatista do PCF, é tributária, o seu entender, de uma concepção de poder incompatível com a descentralização econômica e política que constituiria o requisito indispensável a um projeto ambientalmente coerente.

"Que diferença faz se o setor de energia for estatal - como quer Mélenchon, que propõe re-nacionalizar essa área na França - ou comandado pelo setor privado?', pergunta aquele que há 44 anos era jovialmente conhecido como 'Dani, Le Rouge'.

É um bom debate. Um debate urgente e necessário sobre o passo seguinte da desordem neoliberal. Um debate sobre o projeto de poder capaz de reordenar a lógica predatória dos livres mercados, a ponto de subordiná-los aos desígnios da uma democracia efetiva.

Postado por Saul Leblon

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